Santo António do Zaire, 22 de Maio de 1973 – Petróleo! Escrevo
a palavra, creio que pela primeira vez, e quase que me admiro de a não ver
alastrar no papel numa grande nódoa negra e gordurosa. Há conotações assim.
Apesar de aberto e leve, o som tem no meu espírito um eco denso e pesado.
Contemporâneo do advento triunfal na cena do mundo desse pus untuoso e fétido,
extraído de abcessos recônditos da terra, nunca consegui acomodá-lo
harmoniosamente nos sentidos e no entendimento. Sei que, onde ele aflora, nasce
o oiro. Mas nem assim o amo. Ao ver do céu, há pouco, o primeiro poço a arder,
perguntei a mim mesmo dentro do avião, apesar de o saber alimentado a gasolina,
se aquela chama seria um lume de esperança ou um sinal de maldição. E pouco
depois, junto de uma torre de perfuração, enquanto recebia explicações dos
entendidos e pisava a massa betuminosa que saía das profundidades, ia pensando
na lição que ali estávamos a dar ao indígena. Em vez de emprestarmos
consciência racional à sua riqueza anímica, de lhe abrirmos o entendimento para
as virtualidades da natureza que ama mas desaproveita, ensinamos-lhe a técnica
de a destruir, de a violentar, de a esventrar e de a poluir finalmente com as
fezes da sua própria alma queimada.
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