Está visto: vou
acabar mesmo assim, desesperado. Sempre cuidei que um dia toda esta angústia
tivesse um lenitivo qualquer, mas enganei-me. Pelo contrário. À medida que o
tempo passa, mais agónicas são as horas. A saúde piora, a pátria desintegra-se,
a solidão aumenta. O que, de resto, era de esperar. Um corpo doente desde
criança, dava poucas garantias de uma velhice escorreita; uma pátria repartida
pelo mundo, meio século a caminhar obstinadamente ao arrepio da clarividência,
estava necessariamente condenada à desagregação; quanto ao isolamento, não há
afecto que se compadeça de uma timidez existencial cada vez mais arisca. O poeta
é um trambolho social. Nem Platão
o queria na República dele. Um livro
de versos fecha-se quando nos enfastia ou atormenta. Mas o sujeito que o
escreveu? A pessoa concreta, singular, insólita, estranha mesmo quando o não
quer ser, irredutível a um denominador comum? Que fazer dela? Ignorá-la, é
impossível; suprimi-la, também. O certo é que tudo se conjugou para que eu
chegasse ao fim da existência nesta desolação humana. E o mais trágico é que
fui sempre uma criatura de esperança. Confiei na natureza, confiei na
sociedade, confiei nos amigos. Vivi a vida inteira à espera de milagres que
nunca aconteceram. E vejo agora, numa lucidez cruciante, que já não podem acontecer.
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