Acabei há pouco de
dactilografar o texto sobre Mário Soares escrito
há dias e deixado a «levedar». Ora. O levedar foi escrever quase um texto novo
para tirar ao outro uma certa escrita a mão rápida e grossa. Mas como é difícil
escrever sobre alguém vivo, mormente um político. Porque todos esperam que a
gente vá desencantar neles não bem o que eles querem que a gente diga, mas o
que os alegra que a gente descubra e eles próprios não sabem. De todo o modo,
falar de alguém vivo é sempre tratá-lo com cerimónia. Não louvaminhar, que isso
chateia por ser de cortesão. O que lhes agrada é dizermos bem mas com a
inteligência de quem o não faz por lisonja. Mário Soares, aliás, é um tema
muito batido e é necessário um bom faro para fazer saltar a lebre que ninguém
viu. Tenho um nariz de cortiça. Mas lá o pus ao trabalho e fiz saltar o que
todavia não sei se é lebre ou se é sapo. A minha «tese» é esta: Mário Soares é
um «herói do anti-heroísmo». Os heróis estão hoje em saldo e ninguém lhes pega.
Mas será possível outro em tempos de democracia? Seja como for, houve um tipo,
que sou eu, com trinta e tal volumes obrados e cinquenta anos a suar para isso,
que deixou – prestai atenção, ó pósteros! – entre os milhares de páginas
escritas, algumas rendidas de preito a um presidente da República. Se forem
legíveis daqui a cem anos, Mário Soares é também legível com elas, ou seja com
elas aos pés. Para quem não é rei, nada mau. Não é assim?
*
Comprei a revista Ler
do Círculo de Leitores porque traz
uma notícia sobre o meu próximo romance. Prosa amável e de bom augúrio. Mas
entre as fotografias que a acompanham há uma que me encavacou. Estou ao pé do
retrato que me fez o Rogério, mas esqueci-me de apertar o casaco ou de fazer um
esforço para retrair o desleixo da barriga e o fotógrafo perspectivou-me um
pouco debaixo. Resultado – fiquei grávido.
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