Passos Coelho
não é propriamente um desastrado, porque um desastrado sempre acerta uma de vez
em quando. É certo que tem azar, pois só por impensável azar o INE se lembraria
de divulgar os novos números do desemprego – um milhão de portugueses sem
trabalho – poucos dias após Passos Coelho ter revelado aos desempregados o lado
feliz e solar da sua situação. Mas, para mim, ele é, sobretudo, um
incompreendido: ou as suas mensagens vão ter ao lugar errado (aos ouvidos dos
surdos, como em "A lição", de Ionesco) ou são emitidas em códigos
inacessíveis aos mortais comuns.
De facto, no
mesmo parágrafo do já famoso elogio do desemprego como excitante oportunidade
de mudança de vida, Passos Coelho faz afirmações intrigantes como: "Quem
já passou por experiências mal sucedidas tem obrigação de acrescentar alguma
coisa ao seu saber de não voltar a repetir esses erros" (imagino o
penitente desempregado perguntando-se: "Que erro terei cometido?");
ou: "os erros são limitados" (onde é posta em causa a generalizada
convicção de que errar é próprio do homem); ou ainda: "ser despedido (...)
tem de representar uma livre escolha" (interrogação, em termos
metafísicos, da questão do livre arbítrio patronal em matéria de
despedimentos).
Quem se
surpreenderá que, de Jerónimo de Sousa ao professor Marcelo, ninguém tenha percebido
onde ele quis chegar?
JN, 17/05/2012 – M. A. Pina
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