Recebi hoje os
dois primeiros exemplares do meu romance. Um é para levar amanhã a uns amigos
que nos vão alimentar ao almoço. E o outro é para mim. E para primeira surpresa
das que lá procurava, encontrei uma gralha que eu próprio cometi ao copiar o
original. É na página 274. Onde está «a lei passava por mim» deveria estar «a
lei pensava por mim». Isto é óbvio no contexto. Pois não senhor. Passei por lá
não sei quantas vezes e só vi o invisível. Bom. E o resto? Que estranha a
sensação de ler um nosso livro impresso. Não, não tem nada que ver com a
questão do estar em público e esperar-se que arraste na esteira os seus
admiradores como uma actriz. Não é um fenómeno externo, é um problema de
essência. Subitamente o livro autonomiza-se pela investidura tipográfica e foi
de lá para cá. O que está bem ou mal perturba-me, mas como alguém que eu ensaiei
para o palco e em que não posso ter mão. Um livro impresso é tocado de uma
qualidade sagrada pela sua ascensão a ser vivo. E tanto ele me escapa e
amedronta com a sua autonomia, que o folheei brevemente e o arrumei na estante
como quem fecha um tigre na jaula. Requiescat.
(Só eu próprio não descanso e ando inquieto na pressa e pressão de arrancar com
o meu ensaio. E todavia aflige-me uma certa preguiça interior, que me solicita
a comodidade de ideias já tidas e de escrita já calhada numa certa rede de multiplicação
celular. Ou uma certa nota de ser na selva do dicionário. Ou uma certa maneira
de ser na maneira certa e não valer pois a pena de tentar a possível errada.)
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