Coimbra, 14 de Junho de 1976 –
Estruturalismo. Que força, a de um texto! Uma vez chefiado à existência
impressa, nenhum deixa de ser tal como é, para toda a eternidade. Há um poder
de coesão, uma recíproca necessidade interna, que transmuta duas palavras
articuladas numa realidade inviolável. Alquimia de tal modo misteriosa e provocante,
que, maio primeiro homem organizou um discurso, logo a pertinácia de outros
homens se aplicou em destruí-lo. Pois que é senão vontade de destruição essa
gana sistemática de análise, que disseca uma página tão encarniçadamente que a
deixa seca, mumificada? Metodologicamente alheios à paixão da leitura,
isentam-se de pôr nela a mais leve sombra de equívoca simpatia. Não toleram a
hipótese de se deixar embalar, de se render ao encanto, e defendem-se
deliberadamente com um acervo mecânico e árido de subtilezas. É como se
quisessem desmentir o escândalo da levitação pelo simples enunciado da lei da
gravidade. Mas o verbo incarnado resiste a tudo. Outrora, à caturrice dos
gramáticos; agora, à filáucia dos cientistas. Escrever é um acto ontológico.
Miguel Torga
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