Coimbra, 14 de Junho de 1973 –
Continuo numa espécie de sonambulismo, maravilhado diante de cada árvore, de
cada pássaro, de cada flor, de cada mulher vestida e perfumada. Os sentidos
como que convalescem das violências sofridas. Numa sensação reconfortante,
reencontro pouco a pouco a medida familiar das coisas familiares, o ritmo da
respiração e do sangue. Como as distâncias são curtas e não é necessário
utilizar o avião, entro nos transportes ronceiros de coração sossegado, e cada
pequeno trajecto sabe-me pela vida. Vou vendo casas, caras conhecidas,
monumentos, pombas, jardins. E tudo está certo dentro de mim, arrumado no seu
compartimento emotivo ou sensorial. Sou mesmo um homem civilizado. Não parece,
mas sou.
Miguel Torga
Sem comentários:
Enviar um comentário