O leitor que, à
semelhança do de O'Neill, me pede a crónica que já traz engatilhada perdoar-me-á
que, por uma vez, me deite no divã: estou farto de política! Eu sei que tudo é
política, que, como diz Szymborska, "mesmo caminhando contra o vento/ dás passos
políticos/ sobre solo político". Mas estou farto de Passos Coelho, de Seguro, de Portas, de todos eles, da 'troika',
do défice, da crise, de editoriais, de analistas!
Por isso, decidi
hoje falar de algo realmente importante: nasceram três melros
na trepadeira do muro do meu quintal. Já suspeitávamos que alguma coisa
estivesse para acontecer pois os gatos
ficavam horas na marquise olhando lá para fora, atentos à inusitada actividade
junto do muro e fugindo em correria para o interior da casa sempre que o melro
macho, sentindo as crias ameaçadas, descia sobre eles em voo picado.
Agora os nossos
novos vizinhos já voam. Fico a vê-los ir e vir, procurando laboriosamente
comida, os olhos negros e brilhantes pesquisando o vasto mundo do quintal ou,
se calha de sentirem que os observamos, fitando-nos com curiosidade, a cabeça
ligeiramente de lado, como se se perguntassem: "E estes, quem serão?"
Em breve nos
abandonarão e procurarão outro território para a sua jovem e vibrante
existência. E eu tenho uma certeza: não, nem tudo é política; a política é só
uma ínfima parte, a menos sólida e menos veemente, daquilo a que chamamos
impropriamente vida.
JN, 01/08/2012
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