sábado, 27 de abril de 2013

Coimbra, 27 de Abril de 1977


A sedução do poder! O deleite com que o saboreiam muitos dos que ainda há pouco juravam abomina-lo! Sei que poucos escapam ao seu fascínio, e de que disfarces é capaz. No próprio acto criador se acoita. Mas referia-me ao poder concretamente exercido, a nível de mando. O comportamento desses estadistas de pronto a vestir! O que eles dizem e o que eles fazem! Parecem metidos numa outra pele. Novos penteados, novas gravatas, novos gestos, nova gravidade. São agora mais pernéficos, mais solenes. Adquiriram, sobretudo, uma versatilidade mental e moral inesperada. Como os oráculos, tudo o que lhes sai da boca tem dois sentidos. Falam sempre a cobrir a retirada. Às vezes apetece pôr-lhes um espelho diante dos olhos. Mas talvez fosse inútil. Cegos de felicidade, como poderiam compreender que são uns pobres bonifrates, ao mesmo tempo de boa fé e de má consciência?

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