O bom do Zé
Marinho (que tanto estimo) surgiu-me de súbito no autocarro. Ou melhor: chocámo-nos, visto as nossas concepções
das coisas e dos homens divergirem totalmente.
Suponho que
ele nunca me leu. Nem passou um pente miúdo pelos meus versos e escritos. Mas
por comodidade agrupa-me – e eu deixo-me agrupar – na falange parda dos
esquerdistas ortodoxos, tal qual os reaccionários os vêem. Papel que eu aliás
aceito com gritos e entusiasmo de defender posições extremas em que não
acredito (mas é tão bom ser leal com os camaradas heroicos e medíocres!).
Principiámos
por falar do tempo (frio, calor, etc). Depois, escorregámos para as idades.
Quantos anos? (O Zé Marinho é mais novo do que eu.) Ah! a vida é curta! (Ignoro
como apareceu este lugar-comum na superfície das palavras.) A vida é curta.
Chegou então
a vez de eu repetir o que tão profundamente sinto há muito:
– Não, não… A
vida de cada um de nós é longa… Muito longa… Compridíssima… Uma eternidade até
o fundo de muitos avatares…
Claro, o Zé
Marinho aproveitou logo a «deixa»:
– Não lhe
faltará essa medida nos versos? – perguntou-me com candidez cínica.
Acudiram-me
em tropel várias respostas simultâneas:
– Talvez –
pensei. – Nunca me leu!... – Não se trata de tempo filosófico, psicológico, mas
físico (disparate?)… Essa verdade do tempo é tão sentida por mim que julgo difícil
não se reflectir nos meus versos…
Mas respondi
outra coisa qualquer...
E o Zé
Marinho lá se foi, contente, aos saltinhos, velhinha…
E eu
continuei o meu caminho, a ruminar:
A poesia é
este criar realidade, para o homem sobrenadar no silêncio das palavras…
JGF
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