8 de Maio
Jorge Amado escrevendo do Brasil: «Aqui o sufoco é grande, problemas imensos, atraso político inacreditável, a vida do povo dá pena, um horror.» Diz-me que até ao fim do mês estará na Bahia, que passará por Lisboa antes de seguir para Paris. Esta vida de Jorge e Zélia parece do mais fácil e ameno, uma temporada aqui, uma temporada ali, viagens pelo meio, em toda a parte amigos à espera, prémios, aplausos, admiradores – que mais podem estes dois desejar? Desejam um Brasil feliz e não o têm. Trabalharam, esperaram, confiaram durante toda a vida, mas o tempo deixou-os para trás, e, à medida que vai ele passando, é como se a própria pátria, aos poucos, se fosse perdendo, também ela, numa irrecuperável distância. Em Paris, em Roma, em Madrid, em Londres, no fim do mundo, Jorge Amado recordará o Brasil e, no seu coração, em vez daquela lenitiva mágoa dos ingénuos, que é a saudade, sentirá a dor terrível de perguntar-se: «Que posso eu fazer pela minha terra?» – e encontrar como resposta: «Nada.» Porque a pátria, Brasil, Portugal, qualquer, é só de alguns, nunca de todos, e os povos servem os donos dela crendo que a servem a ela. No longo e sempre acrescentado rol das alienações, esta é, provavelmente, a maior.
José Saramago
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