18 - Maio (quinta). E assim o dia se me perdeu. Porque nem um momento comigo para pertencer ao existente, Tudo porque a noite foi de inferno. O histerismo dos nervos voltou a dar notícias. E antes que desse demais, meti-lhe um comprimido pela boca abaixo. Calou-se. Mas de manhã, logo que me apanhou acordado, voltou a agredir-me. E já o tinha feito pela calada da noite. De modo que ao acordar tinha a cabeça cheia de mossas. Dores, nervoseira, raiva disso e de mim. E assim fiquei com o dia estragado. E para lhe compor os estragos, digo que os tive. Houve ainda uma ou outra epístola que não fazem parte da conversa. Porque o que só fazia era um avanço no romance que lhe rematasse o capítulo (é o XIV). Tenho horror dos dias em que não escrevo. Não o de já não poder em que o p é outra letra. É o horror de não ser, o homem ontológico. Escrevo para estar vivo – eu o disse há milénios. Porque fora da escrita é a morte, ou seja o não-ser. Entendereis isso, ó críticos justiceiros e tabeladores da beleza ou da arte? Sabereis vós todos o que se decide no escrever ou não? Entre um e outro está uma guilhotina. Entendereis isso?
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Por ter ultrapassado o prazo de «prisão preventiva», foina madrugada de hoje solto o Otelo. Que ingénuos a revolução produziu. De todo o modo, estou já a ouvir os homens bancários: qual vai ser o primeiro? Mas não. Desta vez nenhum FP25 pode avançar mascarado.
conta-corrente – nova série I (1989)
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