No pretérito dia 18, um domingo, o terceiro deste mês de Junho, após uma noite de anjos, acordei com a serenata matinal dos pássaros. Com eles fui ao encontro do sol-nado. No regresso, tive um convite:
– Não queres vir à Senhora da Saúde?
– Fazer o quê?
– Comer a merenda.
– Não digas mais. A que horas?
– Lá para a uma.
Ao meio-dia zarpei de Peireses rumo a Vilar de Perdizes. Marcha lenta, janelas franqueadas ao perfume dos campos, um olho na estrada, outro na paisagem.
Picava um ventinho leste e árvores, lameiros e searas pareciam bailar uma valsa de Johan Strauss num salão de cristal e oiro. Oiro das giestas, beleza efémera. Eterna, só a majestade do Larouco, à minha esquerda.
A estrada Montalegre – Vilar de Perdizes é das melhores que temos em Barroso. Passavam por mim carros a altas velocidades. Uns dir-se-ia que vinham a fugir da festa. Outros, que tinham medo de a perder.
Mau grado a marcha lenta, breve cheguei. As filas de carros, ao longo duma e doutra valeta, chegavam ao desvio para Solveira. Inverti a marcha, estacionei e fiz o resto do trajecto a pé.
Pelos ganidos dos altifalantes instalados no campanário da ermida, apercebi-me de que a missa, cantada a grande instrumental e muita roufinheira de vozes e metais, ainda ia no intróito. Tive um baque de estômago: afinal a merenda ainda vinha longe.
Reparei também que a grande maioria dos carros, estacionados e em movimento, era de matrícula espanhola, com predominância das letras OR, que eu suponho indicarem domicílio na vizinha província de Ourense. Já tínhamos uma Nossa Senhora de Galegas, aí para os lados do Cortiço. Agora temos a Senhora da Saúde transformada em festa de galegos.
Bento da Cruz, PROLEGÓMENOS – Crónicas de Barroso (p. 83 e s.)
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