Comissões e opções
Vital Moreira, em post recente, a propósito das pessoas que deveriam integrar a Comissão de Fiscalização do Serviço de Informações, escrevia:
“O lugar dos juízes é nos tribunais. Os juízes de carreira não deveriam aceitar ser indigitados por partidos para funções extrajudiciais, porque isso afecta a sua independência partidária. E o mesmo vale, com as devidas adaptações, para o Ministério Público.”
Este é um tema recorrente que não pode deixar de suscitar interrogações e desconfianças. Seria interessante fazer um levantamento do número de magistrados judiciais e do Ministério Público que estão a exercer funções fora dos tribunais.
É bom que se diga, também, que o legislador tem tido a tentação de estabelecer que certos lugares, que nada têm a ver com os tribunais, devam ser exercidos por magistrados. Por outro lado, os Conselhos Superiores da Magistratura e do Ministério Público (CSM e CSMP) têm-se mostrado solícitos a responder aos interesses dos diversos governos, permitindo a saída de magistrados para áreas exteriores, vindo, com alguma hipocrisia, logo a seguir, clamarem pela insuficiência de magistrados.
Que me lembre, apenas uma vez o CSM não permitiu que um juiz fosse nomeado para um desempenho exterior aos tribunais, no caso Director-Geral da Polícia Judiciária. Passou-se no tempo em que era ministro da Justiça o dr. Vera Jardim e Secretário de Estado o dr. Matos Fernandes. Esta atitude do Conselho não obedeceu a qualquer nova definição de procedimentos mas apenas uma afirmação de força face ao governo socialista. Foi, pois, uma atitude política.
Há uma bolsa de magistrados por conta ou do Partido Socialista ou do Partido Social-Democrata. Sucedem-se em consonância com a sucessão dos partidos nos governos. O que digo não é nenhuma novidade, mas parece que todos (quase) o querem esquecer. Não deixa de ser preocupante o modo como se processam as nomeações e o teor das declarações, de vinculação manifestamente governamental e partidária, que os magistrados envolvidos produzem. Que os políticos não recolhecem aos magistrados nesses lugares qualquer isenção, deduz-se da rapidez com que os substituem quando há alternância no governo.
É insólito que um juiz feito director-geral no Ministério da Justiça dê uma entrevistas ao Diário de Notícias defendendo aquilo que, sendo indefensável, deveria ser a Ministra Celeste Cardona a defender.
O percurso político do actual Director-Nacional da PSP, dr. Morgado, também não deixa de ser insólito: veio com o PSD para este lugar depois de, com o PSD, ao tempo em que era ministro da Justiça o Dr. Laborinho, ter sido Directo-Geral dos Serviços Judiciários.
O caminho do dr. Catarino, actual Director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, também não escapa a uma lógica idêntica.
Não são lugares neutros: têm de se fazer públicas opções políticas e de políticas, o que não deixa de ser incompatível com a independência, e a aparência dela, própria de uma magistrado.
A.R.
# posto por til @ 21.3.04
“O lugar dos juízes é nos tribunais. Os juízes de carreira não deveriam aceitar ser indigitados por partidos para funções extrajudiciais, porque isso afecta a sua independência partidária. E o mesmo vale, com as devidas adaptações, para o Ministério Público.”
Este é um tema recorrente que não pode deixar de suscitar interrogações e desconfianças. Seria interessante fazer um levantamento do número de magistrados judiciais e do Ministério Público que estão a exercer funções fora dos tribunais.
É bom que se diga, também, que o legislador tem tido a tentação de estabelecer que certos lugares, que nada têm a ver com os tribunais, devam ser exercidos por magistrados. Por outro lado, os Conselhos Superiores da Magistratura e do Ministério Público (CSM e CSMP) têm-se mostrado solícitos a responder aos interesses dos diversos governos, permitindo a saída de magistrados para áreas exteriores, vindo, com alguma hipocrisia, logo a seguir, clamarem pela insuficiência de magistrados.
Que me lembre, apenas uma vez o CSM não permitiu que um juiz fosse nomeado para um desempenho exterior aos tribunais, no caso Director-Geral da Polícia Judiciária. Passou-se no tempo em que era ministro da Justiça o dr. Vera Jardim e Secretário de Estado o dr. Matos Fernandes. Esta atitude do Conselho não obedeceu a qualquer nova definição de procedimentos mas apenas uma afirmação de força face ao governo socialista. Foi, pois, uma atitude política.
Há uma bolsa de magistrados por conta ou do Partido Socialista ou do Partido Social-Democrata. Sucedem-se em consonância com a sucessão dos partidos nos governos. O que digo não é nenhuma novidade, mas parece que todos (quase) o querem esquecer. Não deixa de ser preocupante o modo como se processam as nomeações e o teor das declarações, de vinculação manifestamente governamental e partidária, que os magistrados envolvidos produzem. Que os políticos não recolhecem aos magistrados nesses lugares qualquer isenção, deduz-se da rapidez com que os substituem quando há alternância no governo.
É insólito que um juiz feito director-geral no Ministério da Justiça dê uma entrevistas ao Diário de Notícias defendendo aquilo que, sendo indefensável, deveria ser a Ministra Celeste Cardona a defender.
O percurso político do actual Director-Nacional da PSP, dr. Morgado, também não deixa de ser insólito: veio com o PSD para este lugar depois de, com o PSD, ao tempo em que era ministro da Justiça o Dr. Laborinho, ter sido Directo-Geral dos Serviços Judiciários.
O caminho do dr. Catarino, actual Director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, também não escapa a uma lógica idêntica.
Não são lugares neutros: têm de se fazer públicas opções políticas e de políticas, o que não deixa de ser incompatível com a independência, e a aparência dela, própria de uma magistrado.
A.R.
# posto por til @ 21.3.04
Grande cegada
Pelo que dizem os jornais de hoje (DN, JN), os juízes desembargadores Manuel Varges Gomes, Maria Teresa Féria e Clemente Lima, do Tribunal da Relação de Lisboa, consideraram irregular a distribuição do processo Casa Pia ao juiz das liberdades Rui Teixeira, o que configurará a nulidade insanável prevista na alínea e) do art. 119.º do CPP – violação das regras de competência do tribunal – e determinará a invalidade dos actos praticados por esse juiz, bem como de todos aqueles que deles dependerem e por ela puderem ser afectados – escutas, buscas, interrogatórios de arguidos, aplicação de medidas de coacção…
Como diz Costa Andrade, «são afectados os alicerces da casa. E sabe-se que, quando isso acontece, a casa vem abaixo».
A confirmar-se a notícia, pode ser um autêntico desmoronamento. A juíza Ana Teixeira e Silva, para quem foi passada a batata quente, vai ter de contratar uma brigada de remoção de destroços e tentar reconstruir o edifício... enquanto outros vão continuar a dinamitá-lo.
Começo a acreditar que o processo nunca chegará ao fim e que a Justiça é, cada vez mais, uma palavra vã. E lá se vai um dos últimos redutos...
P.S.: Lacão deve aguardar o desenrolar das próximas fases processuais para, só depois, se ainda for vivo, acabar a redacção do anteprojecto.
Topsius
Como diz Costa Andrade, «são afectados os alicerces da casa. E sabe-se que, quando isso acontece, a casa vem abaixo».
A confirmar-se a notícia, pode ser um autêntico desmoronamento. A juíza Ana Teixeira e Silva, para quem foi passada a batata quente, vai ter de contratar uma brigada de remoção de destroços e tentar reconstruir o edifício... enquanto outros vão continuar a dinamitá-lo.
Começo a acreditar que o processo nunca chegará ao fim e que a Justiça é, cada vez mais, uma palavra vã. E lá se vai um dos últimos redutos...
P.S.: Lacão deve aguardar o desenrolar das próximas fases processuais para, só depois, se ainda for vivo, acabar a redacção do anteprojecto.
Topsius
200 Anos
Prazos peremptórios
O Anteprojecto de revisão do CPP do PS, que mais parece um RDM (Regulamento de Disciplina Militar), acrescenta, a martelo, um n.º 3 ao artigo 2.º do CPP com o seguinte teor: Todos os prazos referidos no presente Código têm natureza peremptória e da sua violação decorrem todos os efeitos e consequências nele referidos.
É sabido que o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto (CPC, n.º 3 do art. 145.º).
Significa isto, por exemplo, que, se o Ministério Público não conseguir, mercê das mais variadas vicissitudes, proferir despacho final (acusação ou arquivamento) no termo do prazo de inquérito, mesmo com certas prorrogações, fica impedido de exercer a acção penal. E o mesmo se diga em relação ao juiz de instrução: se não conseguir encerrar a instrução no prazo máximo legalmente previsto, o processo entra em colapso e vai para o arquivo. Ou se juiz de julgamento, quando recebe os autos, porque tem a agenda preenchida, fixa data para a audiência para daí a mais do que dois meses, lá vai o processo para o galheiro. E por aí fora… até à impunidade total.
Sempre julguei que os prazos peremptórios só tinham razão de ser no campo dos direitos e poderes disponíveis. Engano-me.
Com este fundamentalismo garantista, na prática, limita-se desproporcionadamente ou impede-se mesmo o Ministério Público de exercer a acção penal e os tribunais de exercer a função jurisdicional, lançando-se às malvas os artigos da Constituição que consagram esses poderes-deveres. Não será, só por isto, o Anteprojecto do PS flagrantemente inconstitucional?
Os deputados que subscrevem o Anteprojecto não as pensaram. Na sua ânsia de proteger os amigos a contas com a justiça, vestiram a pele de arguido e esqueceram-se da sociedade que os elegeu e seria suposto representarem. A liberdade e a segurança que contam, não são as dos ofendidos e da sociedade em geral, que ficam desprotegidos, mas as dos amigos arguidos.
Esta direcção do Partido Socialista está definitivamente ferida de morte. Bem pode Durão Barroso continuar a desgovernar o País que não tem adversário à altura.
P.S. - Leiam-se aqui outras reacções contra o Anteprojecto de Lacão & C.ª.
Topsius (que, logradamente, votou PS nas últimas eleições)
# posto por A.C. @ 21.3.04
É sabido que o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto (CPC, n.º 3 do art. 145.º).
Significa isto, por exemplo, que, se o Ministério Público não conseguir, mercê das mais variadas vicissitudes, proferir despacho final (acusação ou arquivamento) no termo do prazo de inquérito, mesmo com certas prorrogações, fica impedido de exercer a acção penal. E o mesmo se diga em relação ao juiz de instrução: se não conseguir encerrar a instrução no prazo máximo legalmente previsto, o processo entra em colapso e vai para o arquivo. Ou se juiz de julgamento, quando recebe os autos, porque tem a agenda preenchida, fixa data para a audiência para daí a mais do que dois meses, lá vai o processo para o galheiro. E por aí fora… até à impunidade total.
Sempre julguei que os prazos peremptórios só tinham razão de ser no campo dos direitos e poderes disponíveis. Engano-me.
Com este fundamentalismo garantista, na prática, limita-se desproporcionadamente ou impede-se mesmo o Ministério Público de exercer a acção penal e os tribunais de exercer a função jurisdicional, lançando-se às malvas os artigos da Constituição que consagram esses poderes-deveres. Não será, só por isto, o Anteprojecto do PS flagrantemente inconstitucional?
Os deputados que subscrevem o Anteprojecto não as pensaram. Na sua ânsia de proteger os amigos a contas com a justiça, vestiram a pele de arguido e esqueceram-se da sociedade que os elegeu e seria suposto representarem. A liberdade e a segurança que contam, não são as dos ofendidos e da sociedade em geral, que ficam desprotegidos, mas as dos amigos arguidos.
Esta direcção do Partido Socialista está definitivamente ferida de morte. Bem pode Durão Barroso continuar a desgovernar o País que não tem adversário à altura.
P.S. - Leiam-se aqui outras reacções contra o Anteprojecto de Lacão & C.ª.
Topsius (que, logradamente, votou PS nas últimas eleições)
# posto por A.C. @ 21.3.04
Soneto de Fidelidade
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
Vinicius de Moraes
Estoril, Outubro, 1939
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
Vinicius de Moraes
Estoril, Outubro, 1939
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