Ainda a propósito de Placas Toponímicas
Acabara eu de matricular-me na escola nocturna de mestre Saias, onde havia uma disciplina de Letra Rasgada ou decifração de manuscritos antigos, quando a Jerómina Nova, assim cognominada para a distinguir da Jerómina Velha, me requisitou para, a troco dum ovo de pita, lhe ler uma carta do marido, emigrado na América do Norte.
Encarei no hieróglifo e pedi moratória de oito dias para decifrar o palimpsesto. Por fim sempre consegui meter o dente na charada. Entre o «hoje mesmo lancei mão da pena» da primeira linha ao «kimboio de soidades» da última, o americano dizia que lá lhe chegara a notícia de que a Viúva tinha o Cu-de-sal à venda. Que a sua (dele) rica mulherzinha se informasse se isso era verdade e quanto ela (a Viúva) pedia por ele (Cu-de-sal).
Na ingenuidade dos meus sete anos, andei dias seguidos com esta confusão na cabeça: como é que a Viúva tem cu de sal e este se lhe não derrete com a chuva? Ou com o sol? Será que nunca o lava?
Até que se me fez luz na cachimónia: o Cu-de-sal que a Viúva tinha à venda era uma terra de lavradio com uma poula de codessos ao fundo. Daí o chamar-se ao dito terreno Codessal.
Vem esta história a propósito de placas toponímicas da Junta Autónoma das Estradas. Há no Planalto três aldeias que dão pelo topónimo de Codessoso: Codessoso da Venda Nova, Codessoso de Canedo e Codessoso da Chã (agora perece-me que é Godessoso de Meixedo — que lhes preste.)
Pois bem (ou mal): nas placas toponímicas todas elas andam grafadas com ç (cê de cedilha). Assim: Codeçoso.
Oh, senhores! Se codessoso é terra de codessos, e codesso se escreve com dois esses, porque malas-artes Codessoso se há-de escrever com cê de cedilha?
Ah, abençoada palmatória de mestre Saias! Que falta estás a fazer a este gentio ignorante e rudo…
PROLEGÓMENOS – Crónicas de Barroso, p. 25 e s.
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