1 - Maio (segunda). Que é que se pode hoje ensinar a um jovem? Ou seja, que é que ele já sabe para aceitar o que se lhe ensina? No domínio do saber é talvez mais fácil uma resposta. Mas não totalmente. Em todo o caso, na divisão decisiva do saber técnico-científico e o outro, o dito humanista, o jovem entende-se melhor com o primeiro, não porque seja um saber, mas porque é um instrumento prático como uma alavanca ou martelo. Mas que dizer-lhe sobre o que importa para estar na vida? o significado disso, a justificação disso e a finalidade de tudo, para lá do bem-estar e prazer? Existirá ainda no seu vocabulário a palavra «moral»? existirá a palavra «morte»? Em nome de que é que se pode adiantar-lhe um qualquer «valor»? Que lhe significa a «arte»? a «cultura»? Acaso lhe existe ao menos a pergunta sobre o «para quê»? Terá curiosidade ainda de saber a «razão», seja sobre o que for? Acaso lhe existe ao menos a interrogação sobre o significado da vida? Mas sobretudo – que respostas se lhe podem dar às suas possíveis questões? Destruído o brinquedo político das ideologias, que outro brinquedo se lhe pode arranjar? Que norma se lhe pode impor ou sequer sugerir? O único objectivo de um jovem de hoje é instalar-se na vida. Mas nos intervalos da instalação, quando a tiver conseguido? Falo dos jovens que do «animal racional» não deitam fora o segundo para se ficarem só com o primeiro. Falo dos que reflectem no intervalo do fazer. Dos que se interrogam e não apenas esquecem. Esquecer. Será talvez o limite a que poderão aspirar. Ou apenas não pensar – para dispensar a ajuda da seringa ou do copo.
conta-corrente – nova série I (1989)
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