A Árvore dos
Tamancos, um filme italiano que podia e devia ser rodado em Portugal.
Também entre nós existem ainda mundos rurais miraculosamente intactos, à espera
de uma objectiva que os perpetue antes que desapareçam de vez na voragem do
progresso. Mundos de humanidade, de imaginação, de pobreza, de injustiça e de
lirismo, que mais tarde será preciso reconstituir para se saber que os houve, e
que agora bastaria retratar escrupulosamente, sem retoques, como fez o
realizador transalpino. Cingir-se à realidade e mostrá-la ao natural,
palpitante, viva, cada personagem a ser, em vez de se representar. Mas quem
nesta terra lusitana tem olhos virginais para ver o virginal? Aqui, apenas os
poetas são capazes dessa pureza. Só eles atentam pu1cramente na nossa
fisionomia individual e colectiva. Mas fazem-no metaforicamente, por sínteses
desgarradas que, sendo relâmpagos de claridade, quase sempre deslumbram mais do
que iluminam.
Miguel Torga
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