Um rei assim
O rei assim é
o Sr. D.
Duarte de Bragança, pessoa medianamente instruída graças aos preceptores
que lhe puseram logo à nascença, mas que, não obstante, detesta a literatura em
geral e o que escrevo em particular, primeiramente porque considera que no Memorial do Convento
lhe insultei a família e em segundo lugar porque a dita obra é, de acordo com o
seu requintado linguajar de pretendente ao trono, uma «grande merda». Não leu o
livro, mas é evidente que o cheirou. Compreende-se, portanto, que, durante
todos estes anos, eu não tenha incluído o Sr. D. Duarte, de Bragança,
note-se, na escolhida lista dos meus amigos políticos. Não me importo de levar
uma bofetada de vez em quando, mas a virtude cristã de oferecer ao agressor a
outra face é virtude que não cultivo. Tenho-me desforrado apreciando
devidamente as qualidades de humorista involuntário que este neto do senhor D. João V
manifesta sempre que tem de abrir a boca. Devo-lhe algumas das mais saborosas
gargalhadas da minha vida. Isso acabou, a monarquia foi restaurada e há que ter
muito cuidado com as palavras, não vão aparecer por aí, redivivos, o intendente
Pina
Manique ou o inspector Rosa
Casaco. Como que restaurada a monarquia?, perguntarão os
meus leitores, estupefactos. Sim senhor, restaurada, afirmou-o quem tem as
melhores razões para dizê-lo, o próprio pretendente. Que já não é pretendente,
uma vez que a monarquia acaba de ser-nos restituída pelo drapejar da bandeira
azul e branca na varanda da Câmara Municipal de Lisboa.
Os moços do 31 da Armada (assim os escaladores se designam a si mesmos) têm já
o seu lugar assegurado na História de
Portugal, ao lado da padeira de
Aljubarrota de quem se desconfia que afinal não matou castelhano nenhum.
Não é o caso de agora, a bandeira esteve lá durante alguma horas (haverá um
monárquico infiltrado na Câmara para ter impedido a retirada imediata?),
pretende-se averiguar quem foram os autores da façanha, e isto acabará como
sempre, em comédia, em farsa, em chacota. O Sr. D. Duarte não tem estaleca para
exigir na praça pública, perante a população reunida, que lhe sejam entregues a
coroa, o ceptro e o trono. É pena que uma tão gloriosa acção vá acabar assim.
Mas como, no fundo, sou uma pessoa cordata, amiga de ajudar o próximo, deixo
aqui uma sugestão para o Sr. D. Duarte de Bragança. Crie já uma equipa de
futebol, uma equipa toda de jogadores monárquicos, treinador monárquico,
massagista monárquico, todos monárquicos e, se possível, de sangue azul.
Garanto-lhe que se chega a ganhar a liga, o país, este país que tão bem
conhecemos se ajoelhará a seus pés.
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