Setenta e três anos. E já
quase nem reajo à conta. Sei que é grande e aterradora, mas como sei que há
vulcões e terramotos. Dantes, a data de hoje era sempre um toque a rebate. Todo
eu ficava em pânico com menos alguns meses de existência. Os muitos e
incessantes projectos que fazia pressupunham-me longevo, não admitiam
limitações na minha duração. Agora, que não posso alimentar ilusões de nenhuma
ordem, porque qualquer optimismo seria pueril, os aniversários parecem-me bónus
da vida. Começo a sentir a impressão de que parei no tempo, de que marco passo
em vez de caminhar, de que fiz o que tinha a fazer e tudo o que vier ainda à
rede é por acréscimo. Olho o futuro, e vejo o passado. E como ele foi
aventuroso e rico de mil experiências, com acenos dos quatro pontos cardeais do
mundo e todas as apetências da curiosidade e da compreensão postas à prova,
quando chega este dia, já nem o bendigo nem o maldigo. Remeto-me a um
pragmatismo irónico e salutar: não dá esperança, mas é um bom pretexto para ter
saudades…
Miguel Torga
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