Gostava tanto de poder escrever outra vez o Para Sempre. Não digo escrever outro, mas sim escrever o mesmo.
Poder revisitar a minha juventude e o que foi nela agora a sua imagem terna.
Não sei se este é o meu melhor romance – creio que não. Mas é o que mais amo. O
que equilibra a minha emoção afectiva com discrição que a não deixa
transbordar. O que de longe mais me encanta. E entrelaçado ao encantamento, há
o grave problema de hoje que é o da «palavra». E há o riso. Gostaria de poder
inventar o livro outra vez. Releio aqui ou ali alguns trechos e o encantamento
abre-se loga de novo em mim. Nunca mais.
*
Sinto-me doente. A cabeça e os seus zumbidos. Um enorme mal-estar. A ameaça
de que o cérebro me estoire com um derrame. Estou bem só. On mourra seul.
*
De Coimbra telefonam-me, da parte do Presidente, a perguntarem se recebi um
convite para estar lá hoje a um jantar que ele oferece a «personalidades». Não
recebi. E foi bom não ter recebido. Como iria aguentar-me em sociabilidade,
ameaçado como me sinto de me desmoronar?
*
O Lúcio foi à praia de tarde. Tem o carro que a mãe lhe deu, é para o usar.
E está calor. E está farto de estudar. E há a alegria marítima que lhe está
prometida. E está vivo.
*
Que semana horrível aí me vem. Almoço com os Llansois (Gabriela e
Augusto) que vêm gentilmente para me fazerem um pouco de companhia. De tarde,
ida à Bertrand para acerto de contas a fazer ao cimo do calvário do Chiado. Na
quarta, almoço com as amigas e colegas e jantar no Palácio de Belém para
despedida do embaixador do Brasil, o Alberto da Costa e
Silva. Na terça há qualquer coisa também, mas não consigo lembrar-me o que
é. E há logo na terça seguinte o lançamento do livro da Rosa Maria. E durante
todo este tempo há a minha saúde de miséria com a minha cabeça desvairada de
guinchos e a minha aflição até ao limite do rebentar. Como a vida me é difícil.
Sem a harmonia disponível para traçar uma linha. Estas que traço o demonstram.
Vergílio Ferreira
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