quinta-feira, 25 de outubro de 2012

25 de Outubro de 1977

• Quanto mais os vejo e ouço, mais impelido me sinto a ficar só entregue aos meus pensamentos. E no entanto a solidão dói-me como um pecado inexpiável – e volto sempre a procurar companhia!
• Como é criadora, gloriosa e triunfal, ainda que por vezes cruel, implacável e até crapulosa, a vida e carreira de homens como Eugene O’Neill ou Tennessee Williams, para não mencionar, por exemplo, alguns russos! Quando as comparamos à de certos «génios» familiares, escassamente experientes e pouco produtivos, porque, não tendo vivido, pouco ou nada têm para contar e, no entanto, gozam da fácil glória dos prémios e dos elogios, dos jantares de homenagem, dos títulos honoríficos e até dos necrológios ultralaudatórios! Mesquinhos e pequeno-burgueses na vida e… na morte como se o culto da pessoa pudesse substituir o da Obra.
• O meu preclaro amigo A. Candeias (Prof. Biol. Fac. Ci. Univ. Lx.ª), depois de ter lido o meu ensaio «Quem Paga É o Bey de Tunis»[1] (in É Proibido Apontar) sobre o tratamento dado ao Português no mundo exterior (ele próprio já o expusera e com brilho) e em relação à literatura inglesa teve este comentário: «Mas você é patriota!» Ao que eu respondi logo: «Pois claro que sou!» Foi isto em 1946 ou 47.
Pois bem, trinta anos corridos, e por motivos idênticos (aqui o corpo de delito é As Harmonias do «Canelão»), já houve quem dissesse com ameaçadora gravidade: «Mas você NÃO é patriota!»
Por aqui se vê que não somos nós que mudamos: mas antes os conceitos e as conotações que mudam – não só com os tempos, mas com os ventos!
• Não sei se já notaram que a palavra «pacato» é o exacto anagrama de Pataco? Talvez isso ajude a explicar muita coisa…


[1] «Quem Paga É o Bey de Tunis» é o título da crónica publicada na Seara Nova de 26 de Outubro de 1946 (pp. 188-191). A crónica seria inserta pelo autor em É Proibido Apontar (1964) com o título «Há sempre Um Bey em Tunes». (N. do E.)

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