Há
ocasiões em que os sentimentos valem como argumentos. E ca1ei-o assim: sabia
perfeitamente que a liberdade não é a mola real do homem. Que outras forças mais
poderosas o solicitam a todo o instante. O fanatismo religioso, os mecanismos
económicos ou as paixões políticas, por exemplo. Que não ignorava a que
extremos de servidão podem chegar nações inteiras, cegas pela fé ou rendidas a
qualquer ideologia. Que a ideia de que a liberdade é uma força incoercível tem
muito de romântico. Simplesmente acontecia que tal romantismo, mesmo exautorado,
nunca deixou de fazer frente à opressão, até quando tudo parece perdido. E é
essa vontade insofrível de quebrar todas as cadeias que desde rapaz sinto
também no âmago da alma, embora tristemente convencido pela dura experiência da
vida que este baixo mundo de ilusões não passa de uma redonda clausura.
Miguel Torga
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