George Bush, ou a idade
da mentira
Pergunto-me como e porquê Estados Unidos, um país em tudo grande, tem tido, tantas vezes, tão
pequenos presidentes. George Bush é talvez o mais pequeno de todos eles. Inteligência
medíocre, ignorância abissal, expressão verbal confusa e permanentemente
atraída pela irresistível tentação do puro disparate, este homem apresentou-se
à humanidade com a pose grotesca de um cowboy que tivesse herdado o mundo e o confundisse com uma
manada de gado. Não sabemos o que realmente pensa, não sabemos sequer se pensa
(no sentido nobre da palavra), não sabemos se não será simplesmente um robot
mal programado que constantemente confunde e troca as mensagens que leva
gravadas dentro. Mas, honra lhe seja feita ao menos uma vez na vida, há no
robot George Bush, presidente dos Estados Unidos, um programa que funciona à
perfeição: o da mentira. Ele sabe que mente, sabe que nós sabemos que está a
mentir, mas, pertencendo ao tipo comportamental de mentiroso compulsivo,
continuará a mentir ainda que tenha diante dos olhos a mais nua das verdades,
continuará a mentir mesmo depois de a verdade lhe ter rebentado na cara. Mentiu
para fazer a guerra no Iraque como já havia mentido sobre o seu passado turbulento e
equívoco, isto é, com a mesma desfaçatez. A mentira, em Bush, vem de muito
longe, está-lhe no sangue. Como mentiroso emérito, é o corifeu de todos aqueles
outros mentirosos que o rodearam, aplaudiram e serviram durante os últimos
anos.
George Bush expulsou a verdade do mundo para, em seu
lugar, fazer frutificar a idade da mentira. A sociedade humana actual está
contaminada de mentira como da pior das contaminações morais, e ele é um dos
principais responsáveis. A mentira circula impunemente por toda a parte,
tornou-se já numa espécie de outra verdade. Quando há alguns anos
um primeiro-ministro português, cujo nome por caridade omito aqui, afirmou que
“a política é a arte de não dizer a verdade”, não podia imaginar que George
Bush, tempos depois, transformaria a chocante afirmação numa travessura ingénua
de político periférico sem consciência real do valor e do significado das
palavras. Para Bush a política é, simplesmente, uma das alavancas do negócio, e
talvez a melhor de todas, a mentira como arma, a mentira como guarda avançada
dos tanque e dos canhões, a mentira sobre as ruínas, sobre os mortos, sobre as
míseras e sempre frustradas esperanças da humanidade. Não é certo que o mundo
seja hoje mais seguro, mas não duvidemos de que seria muito mais limpo sem a
política imperial e colonial do presidente dos Estados Unidos, George Walker
Bush, e de quantos, conscientes da fraude que cometiam, lhe abriram o caminho
para a Casa Branca. A História lhes pedirá contas.
José Saramago, O CADERNO
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