Assim vai a justiça
É incrível o que por aí se diz e se escreve acerca da justiça, tudo a propósito do processo da Casa Pia. É como se, de súbito, todas as culpas recaíssem sobre determinadas classes de profissionais da justiça, nomeadamente os juízes e os magistrados do M.º P.º. Todos os restantes portugueses são vítimas do sistema, a começar naturalmente pelos advogados, que são as primeiras vítimas – vítimas do descrédito que grassa pela justiça e que atinge sobremaneira a classe, de forma tão injusta, como foi salientado no discurso inaugural do Congresso da Justiça.
Este panorama, de certo modo, foi propiciado pelos discursos na comunicação social de pessoas responsáveis, entre as quais professores de direito reputados, os quais desataram, sem mais aquelas, a falar generalizadamente da «péssima prática dos juízes portugueses», dos erros crassos cometidos pelo M.º P.º, da falta de preparação dos magistrados, da má interpretação das leis, que é uma pecha, não de juristas quaisquer, mas, evidentemente, de quem as aplica (os magistrados, como não podia deixar de ser). Os códigos são bons, mas os aplicadores deles transformam-se em boicotadores das boas intenções do legislador ou de quem fabrica as leis. Em suma, má preparação, falta de idoneidade democrática, irresponsabilidade, tudo isso a juntar aos proverbiais atrasos, arrastamentos e falta de celeridade alimentam a grande fogueira em que parece pretender-se queimar, com uma certa euforia de bota-abaixo, uma instituição fundamental (toda a gente sabe que é fundamental) para a democracia, mas em que, como é tradicional em Portugal, muitos dos principais «culpados» dessa situação procuram é juntar-se aos denegridores, enquanto assistem ao afundamento do barco que eles também vão empurrando para o fundo.
É neste contexto que pessoas com responsabilidade vão assinando, sem grandes escrúpulos de consciência, textos nos jornais (com poucas excepções, como, por exemplo, a de Pacheco Pereira, ao menos neste caso), onde debitam barbaridades, que se tornaram, entre nós, banalidades repetidas por todos. Veja-se, por exemplo, o que tem escrito Prado Coelho. A facilidade com que ele aponta o dedo aos que se lhe avultam como responsáveis da situação; o desplante com que ele discute provas que constarão da acusação e o juízo de fragilidade que vai emitindo sobre elas, seguindo, aliás, no encalço de outros ilustres comentadores. Vejam esta tirada do nosso Prado Coelho: «(…) a principal contribuição para o sentimento de crise da justiça que se vive em Portugal não vem nem dos jornais, nem dos advogados, nem do Código existente e das suas redacções infelizes, mas, sim, da Procuradoria-Geral da República. É o senhor Procurador Souto Moura e os seus colaboradores, que se julgam Tarzans justiceiros para esconderem melhor a sua manifesta incompetência (o que se consagra na extraordinária figura do juiz Rui Teixeira) que têm vindo a dar uma imagem desastrosa, titubeante, demagógica e impreparada da justiça portuguesa».
Portanto, a crise da justiça portuguesa não está nos advogados, nem nos jornais, nem nos códigos. Está no Ministério Público, representado pelo Procurador-Geral da República e (acho que também posso dizê-lo, uma vez que não foram incluídos nos que Prado Coelho põe a salvo da responsabilidade na crise) nos juízes, personificados na figura de Rui Teixeira. É incrível tanta demagogia. Mas, é claro, Prado Coelho sente-se impelido a falar assim de coisas que não conhece, porque há outros responsáveis com autoridade na matéria que têm vindo a público apontar o dedo exclusivamente a determinados agentes da justiça. E, se há erros crassos que merecem ser salientados, se há magistrados que não trabalham ou cometem asneiras palmares, serão eles, apenas e em globo, os grandes fautores da inacreditável (ah, porque é inacreditável!) crise da justiça? Dá vontade de, no meio desta chicana, pendurar a beca num cabide e deixar a justiça despovoada, para que os predadores de todas crises venham tomar os respectivos lugares.
Adrião Aires
Este panorama, de certo modo, foi propiciado pelos discursos na comunicação social de pessoas responsáveis, entre as quais professores de direito reputados, os quais desataram, sem mais aquelas, a falar generalizadamente da «péssima prática dos juízes portugueses», dos erros crassos cometidos pelo M.º P.º, da falta de preparação dos magistrados, da má interpretação das leis, que é uma pecha, não de juristas quaisquer, mas, evidentemente, de quem as aplica (os magistrados, como não podia deixar de ser). Os códigos são bons, mas os aplicadores deles transformam-se em boicotadores das boas intenções do legislador ou de quem fabrica as leis. Em suma, má preparação, falta de idoneidade democrática, irresponsabilidade, tudo isso a juntar aos proverbiais atrasos, arrastamentos e falta de celeridade alimentam a grande fogueira em que parece pretender-se queimar, com uma certa euforia de bota-abaixo, uma instituição fundamental (toda a gente sabe que é fundamental) para a democracia, mas em que, como é tradicional em Portugal, muitos dos principais «culpados» dessa situação procuram é juntar-se aos denegridores, enquanto assistem ao afundamento do barco que eles também vão empurrando para o fundo.
É neste contexto que pessoas com responsabilidade vão assinando, sem grandes escrúpulos de consciência, textos nos jornais (com poucas excepções, como, por exemplo, a de Pacheco Pereira, ao menos neste caso), onde debitam barbaridades, que se tornaram, entre nós, banalidades repetidas por todos. Veja-se, por exemplo, o que tem escrito Prado Coelho. A facilidade com que ele aponta o dedo aos que se lhe avultam como responsáveis da situação; o desplante com que ele discute provas que constarão da acusação e o juízo de fragilidade que vai emitindo sobre elas, seguindo, aliás, no encalço de outros ilustres comentadores. Vejam esta tirada do nosso Prado Coelho: «(…) a principal contribuição para o sentimento de crise da justiça que se vive em Portugal não vem nem dos jornais, nem dos advogados, nem do Código existente e das suas redacções infelizes, mas, sim, da Procuradoria-Geral da República. É o senhor Procurador Souto Moura e os seus colaboradores, que se julgam Tarzans justiceiros para esconderem melhor a sua manifesta incompetência (o que se consagra na extraordinária figura do juiz Rui Teixeira) que têm vindo a dar uma imagem desastrosa, titubeante, demagógica e impreparada da justiça portuguesa».
Portanto, a crise da justiça portuguesa não está nos advogados, nem nos jornais, nem nos códigos. Está no Ministério Público, representado pelo Procurador-Geral da República e (acho que também posso dizê-lo, uma vez que não foram incluídos nos que Prado Coelho põe a salvo da responsabilidade na crise) nos juízes, personificados na figura de Rui Teixeira. É incrível tanta demagogia. Mas, é claro, Prado Coelho sente-se impelido a falar assim de coisas que não conhece, porque há outros responsáveis com autoridade na matéria que têm vindo a público apontar o dedo exclusivamente a determinados agentes da justiça. E, se há erros crassos que merecem ser salientados, se há magistrados que não trabalham ou cometem asneiras palmares, serão eles, apenas e em globo, os grandes fautores da inacreditável (ah, porque é inacreditável!) crise da justiça? Dá vontade de, no meio desta chicana, pendurar a beca num cabide e deixar a justiça despovoada, para que os predadores de todas crises venham tomar os respectivos lugares.
Adrião Aires
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