domingo, 30 de janeiro de 2011

Os Cordoeiros: Sexta-feira, Janeiro 30 [2004]

Liberdade


Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.

O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

O mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...

Fernando Pessoa 
16-03-1935 (Publicado in Seara Nova, n.º 526, de 11.09.1937)
# posto por Rato da Costa @ 30.1.04

Aforismos

O casamento não é um sacramento, é um serviço social.


Agustina Bessa-Luís

Revista do Ministério Público

Está em circulação a respeitante a Outubro/Dezembro de 2003, nº 96. Com o subjectivismo que uma apreciação destas acarreta, sobrelevo o artigo do Luís Silva Pereira sobre o Mandado de Detenção Europeu. Trata-se de matéria nova e que deixa adivinhar uma aproximação das justiças penais nacionais no seio da União Europeia.

Também lá

La justicia acumula más de dos milliones de casos sin resolver, é título na primeira página de El Pais de 12 de Janeiro.
La jurisdición más atascada es la penal, la que investiga y enjuicia los delitos, con 978793 sumarios todavía sin juicio.

Cunha Rodrigues

Ainda mexe. O Independente promove-o a candidato a candidato a Belém. Grande Loja do Queijo Limiano questiona, inteligente e feroz, o candidato a candidato. De leitura fundamental, não será ousado dizer que a Grande Loja deu o pontapé de saída que vai ajudar a repor a história e a condicionar o futuro.

Tratamentos

Tenho uma dúvida que me assalta sempre e que não consigo resolver através do instituto in dubio pro reo. É a seguinte: deverá dizer-se Meritíssima Juiz ou Meritíssima Juíza? A entendida Edite Estrela sustenta que deve ser "Juíza", mas isso parece-me ser um resquício de feminismo mal resolvido. É que existem palavras da nossa língua terminadas em "...iz" que sugerem ser esta terminação perfeitamente adequada ao feminino: embaixatriz, actriz, meretriz... Existem outras que, por serem solteiras, só podem terminar em "...iz": nariz, chafariz... E muitas outras dão para os dois lados: petiz, perdiz... Inclino-me para que a palavra "juiz" seja desta última categoria. Ou, então, o melhor será os do sexo masculino usarem sempre "juiz" e as do sexo oposto usarem "juiza". Claro que fica sempre de fora um "tertium genus". Alguém poderá elucidar-me sobre esta questão?
Topsius
# posto por A.C. @ 30.1.04

A Penitência...


A Penitência de S. Jerónimo (1518)
Joachim Patinir (1515-1524)

Desmentido e petição

De um senhor magistrado recebemos o seguinte “desmentido e petição”. Ficámos perplexos, pois, com efeito, temos vindo a publicar (apor) umas missivas dirigidas por alguém com o nome do signatário a um tal Cordoeiro-Mor, que, por sinal, também não sabemos quem seja. Só nos resta pedir imensas desculpas pelos incómodos e eventuais prejuízos causados, extensíveis àquele cordoeiro. E logo agora que estávamos a gostar imenso da prosa (conteúdo e recorte literário)!…

«Excelentíssimo Senhor Cordoeiro-Mor

Sou magistrado. Tenho família e ambições profissionais. Fui hoje interpelado por um colega, daqueles que têm o sorriso sardónico de quem não sabe inglês, felicitando-me pela minha participação num blogue denominado Cordoeiros. Fiquei estupefacto. Nunca participei em blogues e, muito menos, sabia da existência de um assim denominado. Respondi-lhe que não participava em blogues, até porque não tinha autorização da hierarquia para o fazer. Mas ele, como bom magistrado que é, não acreditou em mim.
Corri para casa e socorri-me do google. Entre cordas e cordoarias, lá descobri um blogue com a estranha designação de Cordoeiros. Os dedos tremiam-me quando acedi àquele espaço, pressentindo que iria ver o que não queria encontrar.
O meu nome repetia-se, pelo menos, um dezena de vezes, subscrevendo textos que nunca escrevi. Qualquer pessoa de boa fé, legitimamente, não deixará de me associar a essa actividade com a qual nada tenho a ver. Quem se assina como eu, não sou eu. Declaro-o com solenidade.
Não quero fazer juízos precipitados e, por isso, não me atrevo a dizer que alguém anda a urdir uma cabala. Mas que a situação não é agradável e poder-me-á trazer prejuízos, ninguém duvidará. Não é só a minha eventual candidatura à graduação para o Supremo Tribunal de Justiça que poderá estar em risco. A própria ideia que as minhas filhas fazem de mim pode ser abalada, pondo em causa o equilíbrio familiar.
Ninguém será tido por Cordoeiro impunemente. Os delírios verbais daquele que usa, sem autorização, o meu nome, a continuarem, tornar-se-ão, para mim, uma segunda pele. Um segundo destino. E eu não preciso de um segundo destino. Como já disse, o meu passado garante as expectativas relativamante ao meu futuro. Não quero ser prejudicado, e tenho esse direito, por razões a que sou alheio.
É, por isso, que lhe escrevo. Com revolta contida mas também com determinação. Agradecia-lhe, e creio que esse é o seu dever moral, que não permitisse a publicação (publicação aplica-se aos blogues?) de outros textos assinados com o meu nome. A não ser, naturalmente, que sejam textos meus.

Com os melhores cumprimentos

Alípio Ribeiro»

# posto por Rato da Costa @ 30.1.04

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