É natural que a instabilidade governativa se traduza
num aumento das inquietações das sociedades civis que vão sofrendo os efeitos
colaterais das decisões em que não participam, e que inscrevem na soma dos
planos de futuros de vida de cada um, as mais graves incertezas e ainda dos
seres que estão à sua responsabilidade mais direta, nas comunidades de afeto a
que pertencem.
Mas é tão inconstante a conjuntura que nem os
programas que os governos anunciam deixaram de ser sublinhados pelas profundas
desconfianças semeadas pela evolução recente, a europeia e doméstica, nem tais
dúvidas estão necessariamente relacionadas com os responsáveis designados e
assumidos, porque chega a impossível previsibilidade da evolução da conjuntura
para esperar que sejam os planos de contingência, se organizados, que ganhem o
espaço que deveria pertencer à segurança da vida habitual.
Não pode omitir-se que a crise continuará a colocar em
dúvida a viabilidade do euro como símbolo e elo da unidade procurada para a
Europa, ela própria interiormente dividida pelos que aceitaram a moeda, pelos
que não estão seguros de se manterem na zona da moeda, e pelos que recusaram.
É evidente que a rutura teria efeitos devastadores para os Estados em situação de intervenção, mas o crescimento da quebra de solidariedade da parcial unidade monetária obtida não pode deixar de ter efeitos negativos sobre a desejada unidade europeia projetada, já demasiadamente enfraquecida interiormente em mais de um aspeto.
É evidente que a rutura teria efeitos devastadores para os Estados em situação de intervenção, mas o crescimento da quebra de solidariedade da parcial unidade monetária obtida não pode deixar de ter efeitos negativos sobre a desejada unidade europeia projetada, já demasiadamente enfraquecida interiormente em mais de um aspeto.
Não vai seguramente servir de luz ao fundo do túnel a
teologia de mercado que tem prejudicado a observância dos princípios de
solidariedade da União sobretudo quando, como tem acontecido no caso português,
o orçamento parece preencher todo o conceito estratégico nacional, com os
ministros a discutirem com funcionários do sistema o regular desempenho dos
seus compromissos, em vez de fazerem ouvir as vozes dos atingidos pela
fronteira da pobreza no Conselho Europeu, falando como iguais, e usando o poder
da voz contra a voz dos que parecem afetados pela vocação do diretório, sem
prestarem atenção à secundarização dos órgãos da governança instituída pelo
debilitado Tratado de Lisboa.
Infelizmente o credo do mercado parece não reparar no
efeito colateral que é o capitalismo de catástrofe, que implica a fadiga
tributária, o desemprego, a quebra de produtividade, a pobreza violadora da
dignidade humana, uma situação que alguns países, que não servem nem de exemplo
nem sequer de lembrança, dominaram com total esquecimento do Estado de direito.
A doutrina social da Igreja, que vai acompanhando a
mudança dos tempos, insiste em que o mercado necessita de limitações éticas,
incluindo responsabilidades sociais, mas não parece que até agora o poder da
voz consiga dominar a voz do poder, em grande parte sem domicílio e identidade
conhecidos. A linha da pobreza está em processo de aprofundamento, a linha da
ética não aparece reforçada. O futuro da Europa exige que as duas linhas se
encontrem, e que o regresso à autenticidade, isto é, à coerência entre o
anunciado e o feito, incluindo o reconhecimento dos erros cometidos, voltem a
ser fatores de solidariedade entre as sociedades civis e as governanças
nacionais e supranacionais legalmente definidas, evitando o progresso alarmante
da quebra de confiança entre ambas, que os analistas acreditados vão
sublinhando e acrescentando a inquietação com o visível desamor pelo projeto
europeu.
O diálogo em falta não é o que se passa com
funcionários do sistema em crise, é o que não pode ser adiado no centro de
decisão política, em princípio o Conselho, e em que as vozes de todos e cada um
dos membros são igualmente responsáveis pela manutenção dos princípios.
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