Eu
sei que «fumar mata», que «bloqueia as artérias e provoca ataques cardíacos e
enfartes», que «prejudica o esperma e reduz a fertilidade», não tenho dúvida
nenhuma de que «o fumo contém benzeno, nitrosaminas, formaldeído e cianeto de
hidrogénio» e que palavras tão ameaçadoras hão-de decerto causar doenças
esquisitas e terríveis. Perguntar-me-ão então por que fumo. E a única resposta
que tenho, não sendo talvez satisfatória para algumas pessoas, é: « porque
quero».
Como
não pretendo (sou um tipo sociável) matar, bloquear as artérias ou prejudicar o
esperma «dos que me rodeiam», evito fumar perto de quem não queira (pois tem
todo o direito de não querer) fumar o meu fumo, mesmo respirando eu diariamente
o fumo dos seus escapes e o perfume das suas águas-de-colónia (gasto fortunas em
anti-histamínicos para tratar alergias apanhadas em elevadores!).
E
aceito com toda a condescendência de que sou capaz que me expulsem dos seus,
dos não-fumadores, restaurantes e dos seus «locais fechados» (na verdade nem
aprecio especialmente «locais fechados», cabeças fechadas incluídas). Já me é
mais difícil aceitar as suas, e as do director-geral de Saúde, lições de moral,
e o seu paternalismo, até porque as artérias e o esperma são (perdoe-se-me o
pretensiosismo) meus, e enquanto não entrarem em autogestão sou eu quem os
representa. É certo que, se o tabaco um dia me causar um AVC ou outro
tanglomanglo qualquer, os não-fumadores irão pagar com os seus impostos o meu
internamento, mas também eu pagarei com os meus o seu e ninguém me vê a proibi-los
de se atafulharem de macburgers e de álcool (no caso do álcool, os meus
impostos - eu, que não bebo - andam há anos a pagar, além do internamento, a
fisioterapia dos estropiados que diariamente quem bebe, fumador e não-fumador,
provoca na estrada).
Vendo
bem as coisas, em vez de pôr-me uma estrela amarela ao peito e me encerrar em
gafarias com exaustão de fumos, o Estado deveria atribuir-me subsídio de risco
e o Dr.
Teixeira dos Santos condecorar-me pela minha contribuição para a redução do
défice e para a sustentabilidade da Segurança Social. De facto, pago mais
impostos que os não-fumadores e, além disso, morrerei cedo (e nem sequer de
rosas coroado), em vez de me arrastar por aí cheio de saúde até aos 100 anos, a
receber pensão.
Reconheço
que tusso como Lee
Marvin em Cat
Ballou, que, se calha ter que subir a pé um lanço de escadas ou correr
atrás de um autocarro, chego ao fim com os bofes de fora e o coração aos
pinotes, e admito que os meus pulmões, outrora belissimamente cor-de-rosa, se
assemelhem hoje a um saco de borras de café, mas ninguém tem nada a ver com o
preço que pago para fruir o prazer de um Cohiba
ou de um Romeu
e Julieta. Não tenho a mínima intenção de ser o morto mais saudável do
meu cemitério e agora, «when I'm sixty four», aos que lamentam, ó Nise, o meu
estado (mesmo assim, podia ser pior...), respondo, com Humphrey
Bogart, o óbvio: quanto pior se acorda de manhã melhor se passou a noite.
NM,
13/01/2008
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